Para S.M.
e in memoriam Guillaume Apollinaire
quando voltarás Maria
a cidade está silenciosa
os pássaros perfilados
por cima dos anúncios luminosos
e pela praia igual à minha dor
há pedaços de caravelas
não, não se trata de um filme
sobre o Império
quando voltarás Maria
à cidade dos labirintos
em que a mágica calçada
vem da Fenícia e dos jogos romanos
quando voltarás Maria
com os teus livros antigos
à frente do peito
chamando as árvores
e as bougainvilas
com o teu sorriso mais doce
que ameijoas e figos
quando voltarás Maria
com a tua insistência clara
e diáfana mais transparente
que os azulejos e igual
à luz que se foi com o rio
quando voltarás pela manhã
saíndo pelas palmeiras
que levantam a avenida
enquanto os anjos
da má vida sublinham
as olheiras com vermute
quando voltarás com as tuas
saias de Inês de Castro
e o teu corpo de sete partidas
com todo o mistério lento
de quem sai de Portugal
para sempre e para nunca
ah como a vida é lenta
e a esperança violenta
e tu nunca mais voltas
com as ancas como nuvens
descendo a avenida
que os faunos veneram
e os poetas chamam
há milénios com o coração
ardendo como golfinhos
novos na floresta
do desejo e do entendimento
enquanto os cais se iluminam
e as noites se unem
à roda dos teus tornozelos
de loba pura, de corça,
de sereia e de maré cheia
para que as colinas
se inclinem pela claridade
e cada olhar se ilumine
da imensidão do mar
que tu trazes em cada passo
quando voltarás Maria
à cidade dos tristes
trucidados pelo labirinto
esquecidos das gaviotas
cortados pela maresia
com os olhos em maré baixa?
1 Comments:
Lindo!
Marta Spínola
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