HÁ UM TEMPO
há um tempo
há um tempo preciso
em que ao sair de casa pela manhã
se deve pegar fogo ao nosso automóvel
e deixá-lo para trás a arder
com a nossa história pessoal
sem sequer nos virarmos para trás para ver
o fogo surdo das nossas manias
há um tempo
há um tempo preciso
para abrir com toda a calma
o guarda chuva dentro do restaurante
e depois mostrar as maxilas
à estante dos vinhos
e depois de com imensa dignidade
fazer cair todas as garrafas sem um só olhar
para todos os cadáveres que tem dentro
e, depois,
no meio de um mar de vinho
em segunda ou terceira edição
e com prémio,
em alta e portuguesa voz
electrocutada pelos Lusíadas
e todos os anúncios fluorescentes
reclamar: Chefe, onde está o pratinho das azeitonas!
1 Comments:
lindíssimo. A voz da lira num outono primaveril, bebe-se de um trago só na tasca mais próxima.
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