A AVE DOS CONTORNOS DIFUSOS
Eu hoje tive sorte, vi a ave dos contornos difusos. Não sei bem se foi um ver dos olhos ou da mente depois da mente.
Estes poderosos dias de chuva de verão, para mim que vivo no campo e sinto a força dos elementos, levaram-me de volta a interrogar o shamanismo. Nas cidades a chuva também é maravilhosa e transforma-as. Num dia de chuva alguns de nós percebem que não são sólidos. Somos barcos, osmoses, reflexos de anúncios que acariciam a copa das árvores.
Uma das coisas fantásticas do campo é que não há anúncios em parte alguma. Parece um truísmo. Mas os anúncios da cidade interceptam de mil maneiras a visão. Nem sempre de um modo déspota, impondo o seu mantra, o seu produto, a sua narrativa imperativa - sobretudo quando chove ou quando a pessoa os sabe fazer alucinar ou os cruza com nevoeiro, fumo de escape, ou mais subtil com a aura dos harambazords. (ver posts anteriores)
Às vezes esta dualidade cidade/campo desaparece. No campo vejo altas chaminés na copa dos graves pinheiros, na cidade vejo um prado de papoulas construído pelas luzes de travagem dos automóveis no asfalto húmido. Um Manet moderno pode deliciar-se num engarrfamento, à chuva! Eu não entendo histéricos da pressa. Que diabo, há que alquimizar as combustões do quotidiano...Uma vez a bordo de um boeing a caminho da Índia vi que a hospedeira era um cogumelo.
Também não entendo gente ressentida com os infernos, urbanos ou interiores: se estão lá é por pura escolha, são da sua lavra. Há uma falha humana no ressentimento. Não percebo porque não fizeram dele um pecado capital. Nietzche achava-o próprio dos escravos. Vejo-o como o mosquito gigante da alma.
Felizmente as papoulas não tem Bíblia nem os Lírios ataques de narcisismo. Digo isto porque nos últimos tempos antes destas chuvas, abençoadas em África pelo shaman, tenho visto pessoas-Bíblia além dos clássicos atacados por Narciso, uma hoste cada vez mais numerosa e débil, enclausurada nas teias de um nada interior. As pessoas-Bíblia, por exemplo, andam muito zangadas com os tempos e com os outros. Dão corda à barba com tiradas indignadas.
Não é que eu adore estes tempos. Preferia viver no século XIX, com electricidade, num Castelo. Mas acho-os, como a todos os tempos, impermanentes. Por isso não me zangam, nem perturbam. De certo modo pus no monóculo uma certa contemplação sub spetiae aeternitas. Não é que as coisas, lá por isso fiquem mais calmas. mas eu fico. Assisto à turbamulta do mundo com um espírito perfeitamente plácido.
Estas chuvas tem-me andado a transformar em espelho.
Mas não quero ver pessoas zangadas, já vi os angry young men de todas as praças do mundo. In anger deita-se mais fumo pelo crânio, eis tudo. Por onde pára o anjo-clown?
Estes poderosos dias de chuva de verão, para mim que vivo no campo e sinto a força dos elementos, levaram-me de volta a interrogar o shamanismo. Nas cidades a chuva também é maravilhosa e transforma-as. Num dia de chuva alguns de nós percebem que não são sólidos. Somos barcos, osmoses, reflexos de anúncios que acariciam a copa das árvores.
Uma das coisas fantásticas do campo é que não há anúncios em parte alguma. Parece um truísmo. Mas os anúncios da cidade interceptam de mil maneiras a visão. Nem sempre de um modo déspota, impondo o seu mantra, o seu produto, a sua narrativa imperativa - sobretudo quando chove ou quando a pessoa os sabe fazer alucinar ou os cruza com nevoeiro, fumo de escape, ou mais subtil com a aura dos harambazords. (ver posts anteriores)
Às vezes esta dualidade cidade/campo desaparece. No campo vejo altas chaminés na copa dos graves pinheiros, na cidade vejo um prado de papoulas construído pelas luzes de travagem dos automóveis no asfalto húmido. Um Manet moderno pode deliciar-se num engarrfamento, à chuva! Eu não entendo histéricos da pressa. Que diabo, há que alquimizar as combustões do quotidiano...Uma vez a bordo de um boeing a caminho da Índia vi que a hospedeira era um cogumelo.
Também não entendo gente ressentida com os infernos, urbanos ou interiores: se estão lá é por pura escolha, são da sua lavra. Há uma falha humana no ressentimento. Não percebo porque não fizeram dele um pecado capital. Nietzche achava-o próprio dos escravos. Vejo-o como o mosquito gigante da alma.
Felizmente as papoulas não tem Bíblia nem os Lírios ataques de narcisismo. Digo isto porque nos últimos tempos antes destas chuvas, abençoadas em África pelo shaman, tenho visto pessoas-Bíblia além dos clássicos atacados por Narciso, uma hoste cada vez mais numerosa e débil, enclausurada nas teias de um nada interior. As pessoas-Bíblia, por exemplo, andam muito zangadas com os tempos e com os outros. Dão corda à barba com tiradas indignadas.
Não é que eu adore estes tempos. Preferia viver no século XIX, com electricidade, num Castelo. Mas acho-os, como a todos os tempos, impermanentes. Por isso não me zangam, nem perturbam. De certo modo pus no monóculo uma certa contemplação sub spetiae aeternitas. Não é que as coisas, lá por isso fiquem mais calmas. mas eu fico. Assisto à turbamulta do mundo com um espírito perfeitamente plácido.
Estas chuvas tem-me andado a transformar em espelho.
Mas não quero ver pessoas zangadas, já vi os angry young men de todas as praças do mundo. In anger deita-se mais fumo pelo crânio, eis tudo. Por onde pára o anjo-clown?
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