SOLDADO IRAQUIANO
Os meus ossos ramificavam-se como para um abismo
e uma guerra ilimitada
e os meus olhos tocavam com ferocidade
nos céus mudos
eu tinha o direito sombrio dos extasiados
era um soldado iraquiano levado pelos uivos
dos mortos mal feridos com um carimbo na testa
acumulavam-se os cães esquálidos nos bairros mais sórdidos
o pólen chegava entre o odor dos cadáveres
e das pontes quebradas chegavam os suspiros
turvos do aço retorcido
eu era um soldado iraquiano com os olhos
cheios de um suor salgado
saíam-me da fronte braços de choco e de polvo
no meu sangue confundiam-se o álcool e a pólvora
uma bandeira suja e nobre lavava-me as mãos
e a única coisa que em mim pensava
era o vento e a poeira do deserto
eu era um soldado iraquiano depois da humanidade
a minha farda cheirava a tempestade e a casas de passe
o meu cinto descorado cingia-me os rins
e eu multiplicava o meu descontentamento com a voz
funesta das palmeiras calcinadas
eu era aquele que perdeu a tâmara dos dias
não dava semente, atirava a minha língua ao acaso
era um poeta, um soldado iraquiano na noite absoluta
o obscuro senhor do pólen negro
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