/* PRIVILÉGIOS DE SÍSIFO 反对 一 切 現代性に対して - 風想像力: À PROCURA DE MIM MESMO

PRIVILÉGIOS DE SÍSIFO 反对 一 切 現代性に対して - 風想像力

LES PRIVILÉGES DE SISYPHE - SISYPHUS'PRIVILEGES - LOS PRIVILÉGIOS DE SÍSIFO - 風想像力 CONTRA CONTRE AGAINST MODERNISM Gegen Modernität CONTRA LA MODERNITÁ E FALSO CAVIARE SAIAM DA AUTOESTRADA FLY WITH WHOMEVER YOU CAN SORTEZ DE LA QUEUE Contra Tudo : De la Musique Avant Toute Chose: le Retour de la Poèsie comme Seule Connaissance ou La Solitude Extréme du Dandy Ibérique - Ensaios de uma Altermodernidade すべてに対して

2007-06-04

À PROCURA DE MIM MESMO

É certamente outro que escreve os poemas que dizem que são meus. Eu limito-me a caminhar por cima das palavras. Eu não sou real, sou uma sombra, uma declinação de pessoa, um caso português multissecular, um desaparecimento, uma ficção de pessoa. O outro, o poeta, o autor tem uma realidade excessiva, de Doge. Tal como diz Dattatreya tem um ser imutável e tem uma espada cortante e um só Olho: é VajraSattva e Polifemo. Eu só tenho um velho canivete suísso que guardo por pura abjecção e em matéria de terceiro olho mal tenho dois olhos fracos e míopes, que em tudo vêem Manets, Renoirs, e estrelas trémulas por cima das papoulas. Mas sou fraco em nevoeiro. Tenho todos os cansaços da luz! Perco-me em todas as linhas rectas, indecido destinos. Sou um Hamlet de subúrbio (basta ter nascido nesta capoeira lusa ). Não sei entrar na manhã pela calha certa. Acho que me perdi sempre, mesmo nos dias claros.
Enquanto o Outro, destemido, avança pela floresta de enganos, eu enleio-me, fico preso à mínima armadilha do detalhe infinito. Em vez de como Spinoza chegar à face brilhante, e no último face-a-face chegar ao fim de toda a dualidade, eu vejo-me num alface-a-face, num impasse dualista clássico e sem regeneração. Nunca chego ao universal. Estou sempre na sala escura de um cinema, em que o filme congelou, e só se vêem desenhos imprecisos de sombras, navios que desparecem pelo arvoredo, guerreiros há muito mortos mas que ainda mordem no nervo do dia. No fundo, tenho olhos de toupeira, olheiras de rato. Tudo em mim denuncia um ser que vive nas esferas baixas. Este calo humilde na alma evidencia gerações de homens agarrados à pedra, com poeira dos caminhos no focinho. Fomos sempre gente rasteira com uma crosta de sangue no crânio, agarrados à picareta, dizendo blasfémias rosnadas aos grilhões.
Mas o outro voa com a Águia, roeu os olhos a deus e ao diabo, tem as vociferações esplêndidas de um lobo livre, renasce em Ophiusa. E é dele o brilho do vértice, o som silencioso da asa. Eu difundo-me pelas combustões subterrâneas. Confundo-me muitas vezes com o lodo, falo com a boca cheia de algas, sou chispado pela escama primitiva. Caminho aos baldões pela terra dos homens e por cima dos poemas do albatroz e sobretudo dos de Rabelais, tão bem traduzidos por Aníbal Fernandes.

Mas, na verdade, não sei se foi o outro se eu quem escreveu estas linhas.