OS TORNOZELOS DE MADAME POMPADOUR
O ar de faux innocent do ténis provem de ele no fundo ser o herdeiro soft da bota militar. Imagine-se uma bota a que se retirou a pele e só ficou o subcutâneo, eis o ténis.
É preciso mais do que boa vontade para achar que uns ténis são eróticos. No entanto, tem alguns obstáculos à acção que os poderiam tornar interessantes, como os atacadores, que são grandes e algo complicados de desatar, e por isso dão azo às demoras, aos vagares que o erotismo requer e porque fecham/abrem a virgindade do peito do pé e o resguardam de olhares concupiscentes.
(O concuspício é um jogo que se aprende na pré-primária, e que em países atarantados por ayatolas disciplinadores se desenvolve ao extremo.)
Tornou-se o sapato preferido da Xuventude primeiro porque a velhada continuou com os seus sapatos castiços e convencionais, e é sempre preciso destacar-se dela. Uma das armas para dar cabo da velhada são, pois, os ténis. Por isso os optimistas exércitos de Indolescentes ( A indolescência nos nossos dias arrasta-se até depois dos trinta) usam-no massivamente. Na esteira das passagens de milhares de sapatos de ténis o observador cauteloso, o Septikus, detecta cadáver espalmado de velhadas por todo o lado. É a marcha para o progresso que sempre se fez arrasando a geração anterior que, na maior parte dos casos, diga-se de passagem, bem o merece.
Herdeiro da bota militar e também da bota desportiva (a militarização do desporto é óbvia e gritante - paradas, bandeiras, uniformes (o fato treino), corridas geométricas, medições maníacas de tempo ao micro segundo, pistas com tantos metros - porque é que uma pista não há de ter mil trezentos e vinte e três metros, por exemplo? Não pode. Tem que ter uma distância militarizada, uma distância com o cabelo cortado rente, disciplinada: 100, 200,300, 400 metros. E por aí fora. Tudo números militarizados, nítidos, regulares.) o ténis assegura desde logo grandes números. É um sapato massivo, que fica mais bonito quanto mais houver em circulação. Destaca-se não por ser único mas por estar em todo o lado. Daí o seu atributo divino, é omnipresente. E tal como é portador voluntário de omnipresença, com um pouco mais de boa vontade, e não falta, o seu leque de atributos passa a incluir a omnisciência. Eis pois o sapato divino da nossa era, o ténis. Omnipresente, omnisciente, só lhe falta ter um filho divino para o seu Reino se implantar para todo o sempre entre nós.
Seria interessante investigar como seria o Filho do Ténis. Mas fica para outra altura mais azada. Temos ainda que evidenciar como, de potencial objecto erótico e moeda erótica de troca (todos temos ténis, são interpermutáveis, os meus pés sentem o mesmo que os teus, logo partilhamos os mesmos desejos de andar com um saco às costas, de nos sentar nos degraus da estação e de marchar para os amanhãs que esperam a Eterna Indolescência, enquanto comemos comida rápida) o ténis se torna em contradictio de si mesmo.
E essa magna contradictio erótica é simplesmente o cheiro. Apesar de esforçados designers de ténis terem experimentado materiais diversos, há um dado incontornável nos ténis. Usados mais de uma hora seguida, se descalçados, eflúvios mortíferos evolam-se em todas as direcções. Por mais artilhados que os ténis estejam com pó de talco, calicida e desodorizante, uma realidade indiscutível impõe-se - os ténis são fedorentos. Mortiferamente fedorentos. E isso é um lowdown, um tiro nos pés do erotismo. Depois do trabalho divertido e simpático de descalçar o companheiro/a, eis que o nariz do erotic guy in action se sente assaltado por algo provindo da canalização entupida, das fábricas de celulose de Setúbal, dos gases da Refinaria de Sines, de carne podre, de bactéria encarniçada e muito mal cheirosa.
Eros, a não ser em casos de perversão extrema como a coprofilia, convive muito mal com o mau cheiro. Cupido de mãos no nariz pisga-se, aflito, pela esquerda baixa. Não tem conta as vítimas eróticas do chulé. Neste país de anónimo pé fedorento, as silenciosas casualties eróticas não tem fim. Mais do que uma relação gostosamente iniciada com o gesto demorado de descalçar os atacadores do parceiro ficou subitamente inibida quando uma emanação de chulé formato siberiano atacou forte e feio e com uma insídia florentina ambas as narinas dos intervenientes. Uma figura nova, portanto, se começou a desenhar na psicopatologia sexual, o Ténis Interrupto.
Enfim para este post acabar numa nota positiva (estive a ler livros de autoajuda, vê-se logo) dada o número excessivo de vítimas, praticamente toda a indolescência e os velhadas que a imitam (já vi peixeiras de ténis, bem como ladies suburbanas, locutores na moda, etc.) impõe-se, com urgência a formação da ATA = Associação dos Ténis Anónimos.
E regressando ao título deste post (e dando largas ao meu gosto retro de antimodernista assumido), ao menos no tempo da Madame Pompadour viam-se os tornozelos, e apesar de só haver uma casa de banho por km2, o fedor dos pés, a densidade do chulé ambiental era mais baixa. Por isso, penso eu de que, era um siécle d'amours. Quanto ao viagra, ora, ora, já tinham cantáridas.
É preciso mais do que boa vontade para achar que uns ténis são eróticos. No entanto, tem alguns obstáculos à acção que os poderiam tornar interessantes, como os atacadores, que são grandes e algo complicados de desatar, e por isso dão azo às demoras, aos vagares que o erotismo requer e porque fecham/abrem a virgindade do peito do pé e o resguardam de olhares concupiscentes.
(O concuspício é um jogo que se aprende na pré-primária, e que em países atarantados por ayatolas disciplinadores se desenvolve ao extremo.)
Tornou-se o sapato preferido da Xuventude primeiro porque a velhada continuou com os seus sapatos castiços e convencionais, e é sempre preciso destacar-se dela. Uma das armas para dar cabo da velhada são, pois, os ténis. Por isso os optimistas exércitos de Indolescentes ( A indolescência nos nossos dias arrasta-se até depois dos trinta) usam-no massivamente. Na esteira das passagens de milhares de sapatos de ténis o observador cauteloso, o Septikus, detecta cadáver espalmado de velhadas por todo o lado. É a marcha para o progresso que sempre se fez arrasando a geração anterior que, na maior parte dos casos, diga-se de passagem, bem o merece.
Herdeiro da bota militar e também da bota desportiva (a militarização do desporto é óbvia e gritante - paradas, bandeiras, uniformes (o fato treino), corridas geométricas, medições maníacas de tempo ao micro segundo, pistas com tantos metros - porque é que uma pista não há de ter mil trezentos e vinte e três metros, por exemplo? Não pode. Tem que ter uma distância militarizada, uma distância com o cabelo cortado rente, disciplinada: 100, 200,300, 400 metros. E por aí fora. Tudo números militarizados, nítidos, regulares.) o ténis assegura desde logo grandes números. É um sapato massivo, que fica mais bonito quanto mais houver em circulação. Destaca-se não por ser único mas por estar em todo o lado. Daí o seu atributo divino, é omnipresente. E tal como é portador voluntário de omnipresença, com um pouco mais de boa vontade, e não falta, o seu leque de atributos passa a incluir a omnisciência. Eis pois o sapato divino da nossa era, o ténis. Omnipresente, omnisciente, só lhe falta ter um filho divino para o seu Reino se implantar para todo o sempre entre nós.
Seria interessante investigar como seria o Filho do Ténis. Mas fica para outra altura mais azada. Temos ainda que evidenciar como, de potencial objecto erótico e moeda erótica de troca (todos temos ténis, são interpermutáveis, os meus pés sentem o mesmo que os teus, logo partilhamos os mesmos desejos de andar com um saco às costas, de nos sentar nos degraus da estação e de marchar para os amanhãs que esperam a Eterna Indolescência, enquanto comemos comida rápida) o ténis se torna em contradictio de si mesmo.
E essa magna contradictio erótica é simplesmente o cheiro. Apesar de esforçados designers de ténis terem experimentado materiais diversos, há um dado incontornável nos ténis. Usados mais de uma hora seguida, se descalçados, eflúvios mortíferos evolam-se em todas as direcções. Por mais artilhados que os ténis estejam com pó de talco, calicida e desodorizante, uma realidade indiscutível impõe-se - os ténis são fedorentos. Mortiferamente fedorentos. E isso é um lowdown, um tiro nos pés do erotismo. Depois do trabalho divertido e simpático de descalçar o companheiro/a, eis que o nariz do erotic guy in action se sente assaltado por algo provindo da canalização entupida, das fábricas de celulose de Setúbal, dos gases da Refinaria de Sines, de carne podre, de bactéria encarniçada e muito mal cheirosa.
Eros, a não ser em casos de perversão extrema como a coprofilia, convive muito mal com o mau cheiro. Cupido de mãos no nariz pisga-se, aflito, pela esquerda baixa. Não tem conta as vítimas eróticas do chulé. Neste país de anónimo pé fedorento, as silenciosas casualties eróticas não tem fim. Mais do que uma relação gostosamente iniciada com o gesto demorado de descalçar os atacadores do parceiro ficou subitamente inibida quando uma emanação de chulé formato siberiano atacou forte e feio e com uma insídia florentina ambas as narinas dos intervenientes. Uma figura nova, portanto, se começou a desenhar na psicopatologia sexual, o Ténis Interrupto.
Enfim para este post acabar numa nota positiva (estive a ler livros de autoajuda, vê-se logo) dada o número excessivo de vítimas, praticamente toda a indolescência e os velhadas que a imitam (já vi peixeiras de ténis, bem como ladies suburbanas, locutores na moda, etc.) impõe-se, com urgência a formação da ATA = Associação dos Ténis Anónimos.
E regressando ao título deste post (e dando largas ao meu gosto retro de antimodernista assumido), ao menos no tempo da Madame Pompadour viam-se os tornozelos, e apesar de só haver uma casa de banho por km2, o fedor dos pés, a densidade do chulé ambiental era mais baixa. Por isso, penso eu de que, era um siécle d'amours. Quanto ao viagra, ora, ora, já tinham cantáridas.
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