LOS PIBES
as crianças
saem da escola
voltam para os seus
bairros horríveis
cães loucos
mais reais que os seus pais
entram pelas janelas
as crianças são nações perdidas
metem-se umas dentro das outras
voltam aos braços dos seus pais horríveis
que as enxotam
as crianças são moscas sem grandeza
buscam coisas opostas à noite
grandes insectos que as levam à Lua
gostam da poesia das portas partidas
são capazes de beber merda de abelha
e fazem apostas irreais
com o dinheiro do lobo
com o dinheiro do cio
com o dinheiro do mar
que as leva sempre
como focas raivosas e ternas
que rasgam a tenda do circo
3 Comments:
Gosto muito.
Especialmente desta coisa de ser capaz de beber merda de abelha...
Abraço.
São muito experimentalistas, los pibes ; -))
Este poema já não sei se nasceu da imagem, que lembra os Estados Aéreos do Júlio Reis Pereira, ou se a imagem nasceu dele. No fundo, uma Conjunctio Oppositorum, de duas Inocências possíveis: a das Trevas e a da Experiência.
Quanto à "merda de abelha" acho que funciona num duplo registo . A m. propriamnte dita, e comê-la é insólito, anormal inscreve-se no interdito violado, ou pode ser visto como a Recusa do Mel. A Recusa à Saúde, à Normalização, a comer as comidas puras da moral familiar e social.
A minha ideia é que as crianças são uma anti-família temporária. (bem, não exageremos, algumas, porque a maior parte segue dentro dos livros de feu Mme La Comtesse de Ségur, como a Sophia MBA).
Depois é verdade que o conhecimento do mundo começa pela boca, que pode ser um orgão inocente, disposto ao excremencial, à sua prova.
E não há conhecimento do espírito sustentável sem este conhecimento do mundo, ao mais baixo nível.
Obrigado pela visita e um abraço,
Miguel
Olá Miguel.
Eu, por acaso, não sou cliente da poética de Sophia. Aquele "fazer" parece-me mais simplismo que classicismo, e tanta "limpeza" de visão cheira-me a enfermaria desinfectada. Apesar da relação com o mar lhe ter definitivamente dinamizado a sensibilidade, e de as suas Artes Poéticas serem MAGISTRAIS.
Dito isto, eu reajo de duas maneiras:
1. Quando ouço aqueles helenistas cheios de teias de aranha a defenderem que os únicos grandes poetas portugueses depois de Pessoa são a Sophia e o Eugénio, eu viro fera. É um insulto a gente como Carlos de Oliveira, Cesariny, Ruy Belo, Herberto Helder, Luiza Neto Jorge, Alexandre O'Neill, António Franco Alexandre, etc. (a meu ver, todos bem maiores do que Sophia e Eugénio).
2. No entanto, sempre ouvi dizer que a senhora era "cinco estrelas". Não só uma personalidade encantadora, como alguém que os tinha no sítio. De uma imensa rectidão. Por isso, não tenho vontade nenhuma de me armar em purista literário (para a literatura ser grande, tem de ser coisa pequena, como sabe). E depois, eu estou de tal modo a cagar-me para o cânone (ao contrário do Breton, que muito admiro, mas que era um terrorista sedento de poder), que não o quero mudar. Acrescentá-lo, sim (isto é um país de críticos mafiosos que condenam gente fantástica à obscuridade). Mas de resto, eles que reinem nas suas universidades, jornais e entregas de prémios.
Nunca tomarei posição pública contra a poesia de Sophia.
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