Foi bom de ver, a subida da rampa do Palácio de Belém, executada pelo Messias de gravata e Madame Cavaca vestida de azul celeste, num tailleur dos anos oitenta, que podia ter sido usado pela Dama de Ferro, a Margaret Thatcher. O presidente eleito, no seu fato modesto cinzento do poder (Esta
Questão do Fato Cinzento Múltiplo, que alberga todo o tipo de govenantes um dia terá que ser melhor esclarecida) parecia uma testemunha de Jeová, com uma felicidade algo narcótica, como se estivesse já no nirvana, num nirvana onírico, vendo-se a si mesmo desde o alto.
Atrás dele, na terapia familiar da ascenção social em conjunto, vinha o filho ou a filha e outro clone semelhante. A seu lado a neta mais velha.
O trio da frente, rebocado pelo presidente consistia na sua Thatcher, com o azul de quem chegou ao Olimpo, o presidente
himself, com o seu fato de operário cinzento, e a netinha. Com o ar embaraçado e desajustado que os portugueses tem quando estão contentes, vinham contentes e embaraçados alguns militares, com galões. E mais o resto da procissão, que se adivinhava igualmente obsequiosa e contentinha, mas que o operador de câmara da RTP 1 achou por bem ignorar. É pena.
Mas o operador está de parabéns em relação ao protagonista principal do filme. Executava, a passo lento, A Subida da Rampa de Belém. E à pata, diga-se. O operador fixou para a história, talvez sem o saber, sobretudo para a história que foca o triunfo da pequena-burguesia, um documento precioso. O plano geral que deu da rampa, o seu comprimento, as pedras de basalto do chão, o enquadramento do grupo divino, foram excelentes .
E o que vimos? Com paragens frequentes, acenos desvanecidos, um sorriso permanente, em plano fixo (os assessores a soprar nas orelhas, sorria sempre, Excelência, mesmo que tenha caimbras depois... )Sua Excelência subiu. E note-se, sem subir à novo-rico num topo de gama de vidros fumados, num estralhadaço de motas da GNR de cada lado. Cerimónia simples, operária, familiar, estereotipada, embaraçada e muito popular.
Lá em cima no Palácio esperavam o novo presidente coortes de empregados do palácio de Belém. São centenas e centenas deles. Que surpresa, o ror de gente que aquilo tem! Deve haver um empregado e meio por cada sardinheira, para as espanar. A verdade é que aquela massa de empregados via-se logo, são os verdadeiros senhores dos Palácio. Os presidentes vão e vem, eles ficam. E estas centenas de empregados estavam ali não para cum palmae et laude coro0ar o presidente, mas para ver como era o novo empregado de topo, o novo ocupante do cadeirão presidencial.
Não vimos o cadeirão, nem o momento mais nirvânico de todos, aquele em que o novo presidente assentou o seu traseiro no cadeirão, com um sorriso jubiloso, desfrutando mil pensamentos amorosos sobre si mesmo e o seu triunfo. Terá também a netinha sentado o seu mimoso traseiro no cadeirão e Madame Thatcher experimentado as molas do cadeirão com um suspiro?
Nunca o saberemos. O operador de câmara não o poude seguir. E assim se fechou o postal televisivo. Para pendurar em casa, ton sur ton, ao lado do azulejo.